sábado, 31 de dezembro de 2016

SESSÃO 54: 6 DE FEVEREIRO DE 2017


INSTINTO FATAL (1992)

“Basic Instinct” é um thriller onde abunda o sexo e a violência, de construção inteligente, dirigido com segurança e eficácia narrativa pelo holandês Paul Verhoeven, realizador reconhecido ainda na Holanda, por “Delícias Turcas” (1973) e depois, já nos EUA, por “Robocop” (1987), “Total Recall” (1990) ou “Showgirls” (1995), tendo regressado à terra natal para rodar o excelente “Livro Negro” (2006). Partindo de um argumento de Joe Eszterhas (autor deMusic Box” ou “Jagged Edge”, entre outros), “Instinto Fatal” tem tudo para ser um bom policial, tecnicamente impecável e muito bem interpretado. Mas ficará na história do cinema por uma razão bem diferente: nele, a protagonista descruza despudoramente as pernas, durante uma sessão de interrogatório policial, revelando não possuir por baixo qualquer tipo de roupa interior. A protagonista é Sharon Stone, que é uma excelente actriz e que, depois desta sua ousadia, se tornaria num dos símbolos sexuais do cinema norte-americano do final do século XX. Sharon Stone afirmou que, “pelo menos, comprovei que era loura natural”, mas a sua sorte mudou muito. Para rodar “Instinto Fatal”, em 1992, ganhou 500.000 dólares. Depois, para rodar a continuação, “Instinto Fatal 2”, em 2006, cobraria 13.600.000 dólares. Pode dizer-se que foi um deslumbrante descruzar de pernas com repercursões que foram muito além da intriga do filme em questão.
Falemos então de “Instinto Fatal”, que começa com um assassinato muito perturbante e particularmente sádico: Johnny Boz, antiga vedeta de rock, proprietário de um clube noturno em São Francisco, é encontrado morto na sua cama em circunstâncias que não deixam indiferentes nem os mais calejados polícias: várias vezes perfurado por um picador de gelo. A namorada de Johnny é a principal suspeita. Catherine Tramell (Sharon Stone), escultural e atraente escritora de romances policiais que partem sempre da realidade vivida pela autora, não perde a compostura e desafia os investigadores. O caso é entregue ao detective Nick Curran (Michael Douglas), com alcoolismo e drogas no seu passado, vícios a que procura furtar-se. Beth Gardner (Jeanne Tripplehorn), uma psiquiatra da polícia, que em tempos fora namorada de Nick, descobre que o crime que vitimou Boz foi directamente decalcado de um dos romances de Catherine. Nick não consegue escapar ao fascínio de Catherine, sendo atraído por ela, como uma borboleta pela luz (ou o fogo). Um dos aspectos mais interessantes desta intriga é precisamente o jogo de espelhos que se estabelece entre o detective e a suspeita, ambos demasiado iguais para não se compreenderem mutuamente. Um e outra têm as mesmas propensões, são habitados pelos mesmos fantasmas, consumidos pelas mesmas obsessões e fantasias. Catherine afirma a certa altura que Nick Curran será a personagem inspiradora do novo romance que anda a escrever. E o mistério adensa-se, e o perigo espreita, o suspense é irrespirável. Os cartazes da estreia eram claros: "Flesh seduces. Passion kills" ou "A brutal murder, a brilliant killer, a cop who can't resist the danger". Na verdade, nem o polícia resiste ao perigo, nem o perigo se deixa intimidar pela presença da autoridade.


Poderá acusar-se o filme de roçar o soft-porn, de ser excessivo nalguns aspectos, polémico em demasia, o que se consubstanciou rapidamente nas cruzadas lançadas por ligas de decência e movimentos feministas e gays, que logo se manifestaram. Mas a verdade é que visto hoje em dia “Instinto Fatal” mantém um forte impacto deixando cair toda essa ganga polémica que o agitou na altura da estreia. Continua violento e sexy, mas o contexto suavizou-se, e o que ressalta é a qualidade narrativa, eficaz e vigorosa, a ambiência que rodeia as personagens, numa cidade de São Francisco muito bem fotografada, a notória influência de Hitchcock, sobretudo no esboço da protagonista, que alguns aproximam da mulher fatal de “Vertigo”, e uma interpretação globalmente cuidada, onde é, obviamente de destacar o trabalho de Sharon Stone. As acusações de misoginia ou de homofobia parecem-me deslocadas. Será que não pode haver suspeitos de crimes nestes grupos, tal como em qualquer outro? 
A verdade é que “Instinto Fatal” foi um sucesso de bilheteira, e não correu nada mal junto da grande maioria da crítica internacional. Em estreia fez mais de 120 milhões de dólares e lançou Sharon Stone para a mitologia de Hollywood. Alguns anos depois, 2006, surgiria a sequela, “Basic Instinct 2”, dirigida por Michael Caton-Jones, com Sharon Stone a viver em Londres, mas ainda atraída por picadores de gelo. Desta feita é um psiquiatra que a acompanha (David Morrissey), que se deixa enredar no jogo da sedução. Mas o êxito não foi o mesmo. Um picador de gelo não deve voltar ao local onde fora feliz.

INSTINTO FATAL
Título original: Basic Instinct
Realização: Paul Verhoeven (EUA, França, 1992); Argumento: Joe Eszterhas; Produção: William S. Beasley, Louis D'Esposito, Mario Kassar, Alan Marshall; Música: Jerry Goldsmith; Fotografia (cor): Jan de Bom; Montagem: Frank J. Urioste; Casting: Howard Feuer; Design de produção: Terence Marsh; Decoração: Anne Kuljian; Guarda-roupa: Nino Cerruti, Ellen Mirojnick; Maquilhagem: Audrey L. Anzures, Rob Bottin, Catherine Childers, Laura De'Atley, David Forrest, Virginia G. Hadfield, Paul LeBlanc, Vincent Prentice; Direcção de Produção: William S. Beasley, Cliff T.E. Roseman, Michael R. Sloan; Assistentes de realização: Louis D'Esposito, James Arnett, Joel Chernoff, Eric Jewett, Nina Kostroff-Noble, Charlie Picerni, Annie Spiegelman, Michael Viglietta; Departamento de arte: Dick Anderson, Stephen Myles Berger, Mark Billerman, Richard W. Clot, Daniel Kelly, Anne Kuljian, Barbara Mesney, Joseph Musso, Gary E. Roloff; Som: David A. Arnold, Ron Bartlett, Scott Hecker, Zeke Richardson, Fred Runner, Michael R. Sloan, Nelson Stoll, Marvin Walowitz, etc.; Efeitos especiais: John Frazier; Efeitos visuais: Rob Bottin, Al Magliochetti; Companhias de produção:Carolco Pictures, Canal+; Intérpretes: Michael Douglas (Detective Nick Curran), Sharon Stone (Catherine Tramell), George Dzundza (Gus), Jeanne (Dr. Beth Garner), Denis Arndt (Tenente Walker), Leilani Sarelle (Roxy), Bruce A. Young (Andrews), Chelcie Ross (Capitão Talcott), Dorothy Malone (Hazel Dobkins), Wayne Knight (John Correli), Daniel von Bargen (Tenente Nilsen), Stephen Tobolowsky (Dr. Lamott), Benjamin Mouton, Jack McGee, Bill Cable, Stephen Rowe, Mitch Pileggi, Mary Pat Gleason, Freda Foh Shen, William Duff-Griffin, James Rebhorn, David Wells, Bradford English, Mary Ann Rodgers, Adilah Barnes, Irene Olga López, Juanita Jennings, Craig C. Lewis, Michael David Lally, Peter Appel, Michael Halton, Keith McDaniel, Eric Poppick, Ron Cacas, Kayla Blake, Julie Bond,etc. Duração: 128 minutos; Distribuição em Portugal: Studio Canal (DVD); Classificação etária: M/ 18 anos; Data de estreia em Portugal: 7 de Agosto de 1992.


SHARON STONE (1958 -)
A carreira de Sharon Stone teria sido diferente certamente se não tivesse aceitado interpretar “Instinto Fatal” e demonstrar que era “loura natural” ao descruzar as pernas num interrogatório policial, suspeita de ser a assassina de um ex-cantor de rock morto selvaticamente com um picador de gelo, durante uma tórrida cena de sexo. Mas foi ela que protagonizou o mais quente e provocador gesto visto no cinema norte-americano no início da década de 90 do século passado. Por isso ficou na história. 
Sharon Yvonne Stone nasceu a 10 de Março de 1958, em Meadville, Pennsylvania, EUA, filha Dorothy e Joseph William Stone II, um operário industrial. Até aos 15 anos estudou na Saegertown High School, na Pennsylvania e, pouco depois, na Edinboro State University of Pennsylvania, tirando o curso de escrita criativa e artes. Pensava seguir Direito, mas os filmes ocupavam-lhe os tempos livres, sobretudo os de Fred Astaire e Ginger Rogers. Aos 17 anos, increveu-se no concurso de beleza Miss Crawford County e ganhou. Foi empregada na cadeia McDonald, modelo na Eileen Ford Model Agency, entrou em anúncios publicitário, e em 1980, estreou-se no cinema, numa pequena aprição no filme de Woody Allen, “Recordações”. No seguinte, “A Bênção do Anjo Negro”, de Wes Craven já tinha umas linhas de texto. Iniciou assim uma carreira de actriz, em filmes medíocres, com uma ou outra exepção. Em 1984, casou com Michael Greenburg, produtor de “MacGyver”, mas divorciou-se dois anos depois. Em 1990, ao lado de Arnold Schwarzenegger, fez-se notar em “Desafio Total”. Uma sessão de nus na revista “Playboy” deu-lhe passaporte para o papel de Catherine Tramell, em “Instinto Fatal” (1992). Foi o sucesso imediato. Nomeada para o Globo de Ouro pela primeira vez, haveria de ganhar em 1996, com “Casino”. Seria ainda nomeada por “Os Poderosos” e “A Musa”. Para o Oscar, seria nomeada igualmente pelo seu trabalho em “Casino”. Não deixou de aparecer em filmes medíocres, mas começou a surgir em obras de um outro fôlego, onde deu bem a medida do seu talento: The Quick and the Dead (Rápida e Mortal), de Sam Raimi; Casino (Casino), de Martin Scorsese; Roseanne (TV); Diabolique (Diabólica), de Jeremiah S. Chechik; Last Dance (A Última Dança), de Bruce Beresford; The Mighty (Os Poderosos), de Peter Chelsom; The Muse (A Musa), de Albert Brooks; Gloria (Gloria), de Sidney Lumet; Cold Creek Manor (A Casa de Campo), de Mike Figgis; Broken Flowers (Broken Flowers - Flores Partidas), de Jim Jarmusch; Bobby (Bobby), de Emilio Estevez; Alpha Dog, de Nick Cassavetes, entre outros. Entretanto, casou e divorciou-se novamente (1998 - 2004), desta feita com o jornalista Phil Bronstein, editor do jornal “San Francisco Examiner”. No inquérito da revista “Empire” sobre as "100 Sexiest Stars in Film History", apreceu em 49 lugar. Já no “Playboy Magazine”, em idêntica auscultação sobre as "100 Sexiest Stars of the Century", surgiu em 24 lugar. No “People Magazine” surge entre as "50 Most Beautiful People" e as "25 Most Intriguing People".


Filmografia

Como actriz: 1980: Stardust Memories (Recordações), de Woody Allen; 1981: Les uns et les autres (Uns e Outros), de Claude Lelouch; Les uns et les autres (Uns e Outros), de Claude Lelouch (TV); 1981: Deadly Blessing (A Benção do Anjo Negro), de Wes Craven; 1982: Silver Spoons (TV); Not Just Another Affair (TV); 1983: Remington Steele (Quase Modelo, Quase Detective) (TV); Bay City Blues (TV); 1984: Irreconcilable Differences (Divórcio em Hollywood), de Charles Shyer; Magnum, P.I. (TV); Mike Hammer (TV); 1985: T.J. Hooker (TV); Calendar Girl Murders (Assassino das Raparigas do Calendário), de William A. Graham; King Solomon’s Mines (As Minas de Salomão), de J. Lee Thompson; 1986: Mr. and Mrs. Ryan (TV); 1987: Allan Quatermain and the Lost City of Gold (As Minas de Salomão II), de Gary Nelson; Police Academy 4: Citizens on Patrol (Academia de Polícia 4: A Patrulha do Cidadão), de Jim Drake; Cold Steel (Arma Branca), de Dorothy Ann Puzo; 1988: Nico (Nico - À Margem da Lei), de Andrew Davis; Badlands 2005 (TV); Action Jackson (Action Jackson - Homem de Acção), de Craig R. Baxley; 1988–1989: War and Remembrance (TV); Tears in the Rain (Romance Impossível) (TV); 1989: Beyond the Stars (Dois Amigos, Dois Destinos), de David Saperstein; 1990: Blood & Sand (Sangue e Arena), de Javier Elorrieta; Total Recall (Desafio Total), de Paul Verhoeven; 1991: He Said, She Said (A Guerra dos Sexos), de Ken Kwapis, Marisa Silver; Year of the Gun (Brigadas Vermelhas), de John Frankenheimer; Scissors (Violada e Perseguida), de Frank De Felitta; Diary of a Hitman (Contratado para Matar), de Roy London; 1992: Basic Instinct (Instinto Fatal), de Paul Verhoeven; Where Sleeping Dogs Lie (Cães Adormecidos), de Charles Finch; 1993: Sliver (Violação de Privacidade), de Phillip Noyce; Last Action Hero (O Último Grande Herói), de John McTiernan; 1994: The Specialist (O Especialista), de Luis Llosa; Intersection (Encruzilhada), de Mark Rydell; The Larry Sanders Show (TV); 1995: The Quick and the Dead (Rápida e Mortal), de Sam Raimi; Casino (Casino), de Martin Scorsese; Roseanne (TV); 1996: Diabolique (Diabólica), de Jeremiah S. Chechik; Last Dance (A Última Dança), de Bruce Beresford; 1998: Sphere (A Esfera), de Barry Levinson; The Mighty (Os Poderosos), de Peter Chelsom; Antz (Formiga Z), de Eric Darnell, Tim Johnson (voz); 1999: The Muse (A Musa), de Albert Brooks; Gloria (Gloria), de Sidney Lumet; Simpatico (Puro Sangue), de Matthew Warchus; The Sissy Duckling (TV);  Happily Ever After: Fairy Tales for Every Child (TV); 2000: Women Love Women ou If These Walls Could Talk 2 (Amor no Feminino) (TV); Beautiful Joe (Hush - Um Sonho de Mulher), de Stephen Metcalfe; Picking Up the Pieces (Uma Mão Cheia De Surpresas), de Alfonso Arau; 2001-2002: Harold and the Purple Crayon (TV); 2003: Cold Creek Manor (A Casa de Campo), de Mike Figgis; The Practice (Causa Justa (TV); 2004: Catwoman (Catwoman), de Pitof; A Different Loyalty (Lealdade Traída), de Marek Kanievska; 2005: Broken Flowers (Broken Flowers - Flores Partidas), de Jim Jarmusch; Kurtlar Vadisi (TV); Higglytown Heroes (TV); Will & Grace (TV); 2006: Basic Instinct 2 (Instinto Fatal 2), de Michael Caton-Jones; 2006: Bobby (Bobby), de Emilio Estevez; Alpha Dog, de Nick Cassavetes; Huff (TV); 2007: Democrazy (curta-metragem); If I Had Known I Was a Genius (Se Eu Soubesse Que Era Um Génio), de Dominique Wirtschafter; When a Man Falls in the Forest, de Ryan Eslinger; 2008: The Year of Getting to Know Us (O Ano em Que nos Conhecemos), de Patrick Sisam; $5 a Day (A Culpa Não Foi Minha!), de Nigel Cole; 2009: Streets of Blood (Ruas de Sangue), de Charles Winkler (Vídeo); 2010: Law & Order: Special Victims Unit (Lei & Ordem: Unidade Especial) (TV); 2011: Largo Winch II (Largo Winch 2 - Conspiração na Birmânia), de Jérôme Salle; 2012: The Mule (Tráfico na Fronteira), de Gabriela Tagliavini; 2013: Lovelace (Lovelace), de Rob Epstein, Jeffrey Friedman; Gods Behaving Badly, de Marc Turtletaub; 2014: Fading Gigolo (Quase Gigolo), de John Turturro; Un ragazzo d'oro, de Pupi Avati; Lyubov v bolshom gorode 3, de Marius Balchunas e David Dodson; 2015: I Life on the Line, de David Hackl; Savva. Serdtse voina, de Maksim Fadeev (voz); Agent X (TV); 2016: What About Love, de Klaus Menzel; Mothers Day, de Paul Duddridge, Nigel Levy; Running Wild, de Alex Ranarivelo; The 11th, de Xavier Nemo;

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